São João Paulo II, curtido pela limitação... (Marta V. Almeida)

Parecia ser a última estrela que havia no céu...
A imagem profética de João Paulo II que quero guardar nos olhos, a que quero ter no coração quando a Igreja o chamar de "santo", no domingo, é, talvez, a mais paradoxal: a do tempo de sua agonia, literalmente, em praça pública.

Aquele homem alquebrado, exausto, por vezes incapaz até de manter os olhos abertos, carregado daqui para lá sobre rodinhas, de fala incompreensível, era uma imagem que assustava o mundo. A voz da nossa angústia não cessava de gritar: "Porque esse homem não renuncia? Porque não deixa o papado? Porque esse Papa persiste?"

Para muito além da compaixão, do nosso amor ou preocupação com ele e com a Igreja - que existiam, obviamente - havia também o terror atávico do ser humano diante da invalidez, da impotência, da debilidade, da feiúra, da decadência, da decrepitude, da morte…

O horror dos últimos dias de João Paulo II transformava-se, para mim, a cada dia, num testemunho eloquente de que "a sabedoria aos olhos do mundo é loucura aos olhos de Deus"… Eu, na corrente contrária, torcia para que ele aguentasse, confesso. Dizia a ele, silenciosamente: "Fica! Resiste até o fim…"

Porque, da imagem daquele homem nos últimos dias de vida, vinha a mensagem de que algo tem que ser revisto numa cultura que deposita todos os seus valores no poder, na força, na beleza, no desempenho, na capacidade.

Da agonia de João Paulo II emanava a visão de que a vida humana tem, em si, algo que transcende tudo isso. Seu real valor não se restringe à utilidade, produtividade, ou poder, mas alcança o ápice ao tocar o mistério de seu significado.

Muitos daqueles a quem João Paulo II comoveu não sabem da vida dele mais do que seu martírio… Eram, em grande parte, mártires anônimos do quotidiano, da pobreza, do preconceito, da doença, da decrepitude, que se comoviam ao ver-se "representados" por esse homem que gritava o SIGNIFICADO da vida!

E quem poderia definir, esgotar e circunscrever esse valor, esse significado? 

Quando domingo chegar, João Paulo II será, para mim, o santo que testemunhou o valor das coisas absurdas, o significado inesgotável da vida humana, o sentido que há em tudo aquilo que tememos, que evitamos, que nos dá, às vezes, asco de olhar. Bastará, para mim, que ele seja ESSE santo...

Voltarei à Vila do Pequenino Jesus, aos meus pequeninos, com alegria redobrada! Abraçarei meus meninos com uma emoção renovada, e sei que sentirei, no fundo de minha alma, que nossos trabalhos, mais do que nunca, são testemunho do Mistério Vivo.

Que todos os santos de todos os absurdos intercedam por todos nós - O amor é louco… - diante do trono da Luz.

Amém

7 comentários:

  1. Não é o santo de minha devoção...

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  2. JP II também não me inspira muito, mas se a Igreja diz que o preto é branco, eu vou procurar o branco, como dizia santo Inácio...

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  3. "Olhemos nossas próprias faltas e deixemos as dos outros. É muito próprio de pessoas 'corretas demais' escandalizarem-se com tudo...
    E talvez tivéssemos muito a aprender, naquilo que realmente importa, com aqueles diante de quem nos escandalizamos. Não há porque desejar que todos sejam iguais e vão pelo nosso caminho."
    Teresa de Jesús

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  4. João XXIII foi beatificado juntamente com Pio IX, um papa que foi o avesso do avesso do avesso de João que convocou o Concílio Vaticano II! Escrivá foi beatificado com a, atualmente, Santa Bakita, em 92. O alto escalão da Opus Dei tentou botar Negra numa outra data... Agora, o pobre João XXIII ficou "prensado" entre Pio IX e o Papa polonês... Que mensagem devemos "captar" nessas políticas de canonizações? E o nobre Paulo VI já não existe na memória da política santificadora do Vaticano? Final trágico do papa polonês? Senti minha humanidade ultrajada, quando, por acaso, o vi babando sobre os papéis que deveria ler no Angelus de não sei quando... Esperaria dele (ou da sua "produção") alguma noção cristã sobre o LIMITE humano... Mas, ele, polonês teimoso, sobreviveu (naturalmente?) demais... graças a um punhado de coisas... Mas, também, graças ao ao Vaticano que tinha como pagar a clínica mais cara de Roma... Sendo assim, quero todos os que morrem por falta de assistência médica canonizados....

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    1. Amigo, acho que você não entendeu nada deste artigo.. ou, se entendeu, fez questão de ignorar...

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  5. João Paulo II agarrou-se ao poder até o fim da sua vida. Essa atitude não me pareceu positiva, edificante. Acho que ele não foi humilde o suficiente para reconhecer a sua humanidade, o seu limite. Pena!

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