Introdução ao AT: A Bíblia...

Sem o toque divino nunca sentiremos nem veremos além da realidade...
A Bíblia é uma ‘biblioteca, coleção de 72 livros, (45 do AT e 27 do NT), muito diversos na forma, mas formando uma unidade. Os livros foram escritos no decorrer de 10 séculos por autores diversos. Uns foram escritos em hebraico (AT), outros em grego (NT) e apresenta gêneros literários diversos (narrativa histórica, código de leis, pregação, oração, poesia, cartas, romances, etc.) O nome dessa coleção em grego é Ta Bíblia (os livros!). A divisão em capítulos foi introduzida pela Bíblia latina (1214), para facilitar as citações, e os versículos do NT em 1555.

Os livros da Bíblia foram escritos originalmente em 3 línguas: hebraico (AT), aramaico (Tb, Jd, Br, 1 Mc) e grego (NT).

Deus nos ama do início até o final dos tempos. Imaginar um Deus bom que dá coisas boas a uns e não a outros, é impossível. Neste sentido, não há um 'povo eleito', mas um povo que toma consciência da sua eleição por Deus.

A história de Israel está sempre penetrada e sacudida por esta consciência. Povo pobre e pequeno, frequentemente vencido e desprezado pelas grandes potências em cada época da sua história (Egito, Assíria, Babilônia, Grécia, Roma...). ‘Os pobres e oprimidos não tem livros. Não escrevem, e assim, sua memória se perde’ (J. Comblin). A história deste povo só foi escrita com a atuação surpreendente e eficaz do espírito de Deus. A Bíblia não é apenas o livro do Israel oprimido, mas de todos os povos oprimidos de hoje. A Bíblia é o livro dos escravos, dos prisioneiros e dos explorados e graças a ela, os pobres tem um passado, uma memória que lhes permite pensar seu presente e projetar seu futuro.

Não se pode entender o texto da Bíblia sem o toque de Deus e o contexto da vida.

1. Autor e autores. Quem escreveu os livros da Bíblia, mensagem de Deus veiculada pela palavra humana? Estes livros procedem de diversos autores com uma convicção comum: Deus os destinou a formar um povo. Este povo é testemunha do que Deus fez por ele e com ele. Não é apenas um livro que fala de Deus, mas um livro no qual Deus fala (Dt 32,47; Jo 20,30-31).

Estes autores ajudaram a compor a Bíblia por mais de dez séculos. O povo de Israel sempre foi conhecido como o povo do Livro. Deus é autor e os escritores aportam seus conhecimentos (não é pura passividade com perda da consciência!). São verdadeiros coautores, daí os estilos literários diversos. A inspiração não é, pois, um ditado, onde Deus comunica ideias e até palavras. O instrumento humano pode ser deficiente, mas não a revelação inspirada na sua totalidade.

A Bíblia não comunica algo, mas Alguém.

2. Algumas dificuldades. Diante do AT cabem diversas posições:
ü  Radical: Não precisamos do AT (Marcion, Maniqueus e alguns palestinos cristãos de hoje...);
ü  Atenuada: O AT não tem o mesmo valor que o NT (A. von Harnack/1920) ou ele apenas mostra o que o NT realmente não é (Lutero).
ü  Católica: Não se entende o NT sem o AT. A Igreja tem suas raízes no AT. A Bíblia cristã está composta pelas ‘Sagradas Escrituras’ (Rm 1, 2) do povo judeu e os Escritos do NT. Contudo, esta relação é complexa.    

Primeiro foi a experiência de Deus que logo se transformou em tradição oral formando, séculos depois, o texto. Essa Tradição oral formou o Texto, e outros textos posteriores: ‘Mischna[1], ‘Tosefta[2] e o ‘Talmude[3]. Os saducéus[4], aristocratas e sacerdotes, rejeitaram a tradição oral.

Os primeiros cristãos, todos de origem judaica, só aceitaram as Sagradas Escrituras (AT). Eles acrescentarão depois o ‘ensinamento dos apóstolos’ (At 2, 42), Tradição oral ‘cristã’, que formará o NT.

Canonicidade das Escrituras. A fé judeu-cristã estabeleceu um “Cânon” normativo, para conservar a revelação. Isso levou tempo e reflexão. Nessa ‘canonização’ a igreja põe em relevo o carater ‘inspirado’ desse livro (não cria sua inspiração!). O Concílio de Trento (1546), seguindo a tradição do Concílio regional de Hipona (393) e o de Cartago (397) fixa o Cânon: 45 livros do AT (6 dos quais deutero-canõnicos: Siracides, Baruc, Tobias, Judite, Sabedoria, 1 e 2 Macabeus, parte de Ester e de Daniel) e 27 do NT. Os Apócrifos[5] (livros secretos para iniciados!) não foram admitidos no catálogo oficial da Igreja. 

Nosso povo tem problemas com as diferentes formas da Bíblia: Católica e Protestante... No tempo de Jesus, o judaísmo transmitia suas Escrituras quer na língua hebraica ou na tradução grega, pois o grego era língua comum e muitos judeus fora de Israel (‘diáspora’) o falavam. A tradução grega foi iniciada pelos anos 250 aC, em Alexandria (Egito). Essa tradução grega, Septuaginta (70 escribas!), incluía mais livros do que o texto hebraico usado. Católico e Ortodoxos usaram esse texto mais amplo. Os reformadores protestantes (s. XVI) fizeram traduções usando o Cânon restrito hebraico, dai as diversas configurações do AT.

3. Crítica moderna do AT. Até 1650 a exegese cristã considerava a Bíblia como um bloco literário descido do céu, descuidando a atividade do autor sagrado. O humanismo do Renascimento exalta o conhecimento. Começa a crítica textual, usada nas obras literárias, determinando os gêneros literários.

Todo ‘texto’ deve ser lido e interpretado no seu ‘contexto’. Se não soubermos ‘ler’ a Bíblia, cairemos no fundamentalismo dos fanáticos. Buscamos ser ‘formados’ e não apenas ‘informados’.

A Bíblia é o único livro cujo autor sempre está presente quando a lemos.



[1] Mishná: A mais antiga compilação da Lei Oral redigida em aramaico em 200 dC.
[2] Tosefta: Segunda compilação da lei oral no período da redação da Mishná (cerca de 200 dC).
[3] Talmude: Compila discussões rabínicas sobre leis, tradições, costumes e histórias. A Tradição Oral variava conforme as diversas escolas (mais famosas: Shammai e Hillel.
[4] Desaparecem com a destruição de Jerusalém pelos romanos (70 dC).
[5] AT: Henoc (Sec. II aC), Livro dos Jubileus (sec. I aC), Testamento dos 12 Patriarcas (sec.II aC), 3 e 4 Macabeus , Oração de Manasés, Oráculos Sibilinos... NT: Ev. de Tomé (sec. II), Ev. dos Hebreus (sec. II), Ev. de Pedro (sec. II), Protoevangelho de Tiago (sec. III)...
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