O olho do Espírito...

Com pedaços de mim eu monto um ser atônito... (M. de Barros)

Ken Wilber, num dos seus livros, fala dos três olhos do conhecimento: o da carne[1], o da mente[2] e o da contemplação[3]. O primeiro vê a realidade externa e sua evidente manifestação; o segundo, o da razão, adquire melhor conhecimento pela atividade mental dando significados; o terceiro vai além dos sentidos e da razão, permitindo o acesso às realidades mais profundas e transcendentes.

Todos temos estes três olhares, mas acabamos optando por um deles ao longo da vida. Cada olhar enxerga o seu próprio mundo e também o anterior, mas não o que está por cima. Por isso, o olhar contemplativo inclui os outros dois (o carnal e o racional), mas não é compreendido por eles. Evidentemente, os dois primeiros olhares não enxergam tudo. Para enxergar com o “o olho do Espírito”, o espiritual, se requer a contemplação. É chegar a um estado interior profundo e grande, em comunhão com tudo e todos, onde a realidade adquire maior significado e sentido. O um se faz parte do todo e o todo se faz presente no um.

São Paulo diz algo semelhante: “Nós não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que vem de Deus, a fim de conhecermos os dons da graça de Deus. E não falamos deles na linguagem da sabedoria humana, mas na que é ensinada pelo Espírito, exprimindo o espiritual em termos espirituais. O homem natural não aceita o que vem do Espírito de Deus. Para ele, é uma loucura, ele não o pode conhecer, pois isto se julga espiritualmente. O homem espiritual julga tudo e não é julgado por ninguém...” (1 Cor 2,12-15).  

Para acolher com misericórdia e ajudar com ternura é preciso ir além do que carnalmente vemos.

Toda realidade é como um iceberg: esconde mais do que revela. A mesma ciência não chega ao fundo das questões. Quanto mais estuda, mas compreende que enxerga pouco. Fechar os olhos e abrir o coração talvez seja o melhor caminho para a fraternidade universal. O mistério faz parte da vida, por isso os artistas e os místicos são os que melhor sabem expressá-lo.

Este olhar do Espírito é a forma mais aguda da sensibilidade e da sabedoria humana, do entendimento e do amor. É o “ser contemplativo na ação” inaciano. Frequentemente ficamos aquém das nossas possibilidades no torpor da negligência, do descuido e da desatenção. A vida perde, desse modo, sua graça e sentido. É preciso acordar, dar-se conta de algo maior, misterioso e belo, envolvendo tudo e todos. O olho do Espírito contempla não só a realidade, mas sobretudo o amor e a beleza que ela contem.

Uma pergunta: Você já chegou ao terceiro olhar?



[1] Só percebe o mundo externo. Mundo do pré-simbólico.
[2] Supera o olhar carnal e percebe os pensamentos, as emoções, a fantasia e a razão. Mundo do simbólico.
[3] Supera o carnal e o mental. É transracional e místico. Mundo do trans-simbólico. Conhecimento direto, definido e claro; transcende a toda conceitualização.  

Um comentário:

  1. Bom dia Meu amigo,

    Estou precisando aprender a olhar com os olhos de contemplação, qual seria o melhor caminho?
    Obrigado por ter sido genioso na cartilha do peregrino, está me ajudando muito.
    Preciso ir te visitar!
    Um grande Abraço
    Cauê Baldi

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