“O
tempo já se completou e o Reino de Deus está próximo...”
(Mc 1,15)
Apagaram-se
as luzes do Natal; os Magos voltaram a seus países;
Jesus foi revelado como o “Filho amado” no Batismo. Agora começa o tempo do “chamado”, para “fazer caminho com Jesus. É o
“tempo do seguimento”.
Jesus irrompe na nossa Galileia
cotidiana com um chamado para viver de maneira alternativa, mais
humana e ditosa.
Jesus não começa sua vida pública com ameaças, nem com
anúncios de castigos. Começa proclamando a Boa
Notícia de Deus: “O tempo já se completou e o Reino de
Deus está próximo”. Tudo aquilo que “buscamos”, já está
próximo.
E para
acolher esta Boa Nova faz-se necessária uma profunda conversão. O termo “conversão”,
traduzido do grego “meta-noia” (mais além da mente), nos convida
a “outro
modo de pensar, de ver, de agir...”
Jesus não deixou como herança uma nova
doutrina religiosa da qual se pode extrair alguns princípios que logo são
aplicados à vida. O que Ele nos traz, a partir de sua experiência profética, é um novo horizonte para assumirmos a
história, um novo paradigma para humanizar a vida, um marco para construir
um mundo mais digno, justo e ditoso.
Sua mensagem não provém do interior do
sistema imperial nem da instituição do Templo. Pelo contrário, desmascara a iniquidade do Império e a
conivência do Templo, sacudindo a indiferença de muitos e redefinindo as
expectativas de outros.
Jesus
não é um escriba judeu, nem um sacerdote do templo de Jerusalém, nem um asceta
do deserto. O específico seu não é
ensinar uma nova doutrina religiosa, nem explicar a Lei de Deus, nem
assegurar o culto de Israel. Jesus é um
profeta itinerante, um homem a caminho, aberto às surpresas de Deus.
Caminhava pela Galileia, anunciando um acontecimento, algo que já
está ocorrendo e que pede ser escutado e atendido. Ele desencadeia um novo movimento
humanizador, que coloca o ser humano no centro de sua missão. Deus
está comprometido com a história humana, por isso é preciso mudar e viver tudo
de maneira diferente.
Começa um tempo
novo, uma história nova. Deus não nos
deixa sozinhos frente aos nossos conflitos, sofrimentos e desafios. Quer
construir, conosco e junto a nós, uma vida mais humana. Para isso, é preciso
mudar a maneira de pensar e de agir.
O que Jesus chama “Reino
de Deus” não é uma religião. É muito
mais. Vai mais além das crenças, preceitos e ritos de qualquer religião. É uma
experiência fundante de Deus que re-significa tudo de maneira nova.
Jesus
nunca define o que é o Reino de Deus. Ele
o encarna em suas palavras e em sua vida; é algo que irrompe, de maneira surpreendente.
O “Reino de Deus” é a vida, tal como Deus deseja que a vivamos.
Se
queremos saber o que é o Reino, também nós devemos nos colocar a caminho com Jesus: Ele é o Reino.
Para Jesus, a vida de uma pessoa vale pela causa à qual se entrega.
Ele desperta nas pessoas uma garra, uma vibração e um entusiasmo nobre. Acolher a proclamação do Reino é uma prova
de audácia e coragem.
É preciso sonhar alto, ter ideais, ser uma pessoa corajosa e
marcada pela esperança para poder “escutar”
o apelo de Jesus; é preciso ser apaixonado, aceitar
correr riscos na vida para saber o que significa “estar e fazer caminho
com Ele”; é preciso forte dose de ousadia para transcender-se, ir além
de si mesmo...
Jesus
não só se deixou mobilizar pelo “sonho do Reino”, mas foi também capaz de
seduzir e mover outras pessoas a participarem desse mesmo sonho.
Por isso, os primeiros discípulos deixaram-se impactar pela força do seu
chamado e foram capazes de dar uma nova direção às suas vidas.
Todas as narrativas acerca do chamado
conservam a marca intencional de um encontro surpreendente, inesperado e
expansivo: deixar a vida estreita do lago de Genezaré para entrar no vasto
oceano de vida.
Há um dado, um tanto quanto estranho no
chamado de Jesus: parece ser um chamado
que quase não tem programa. Ele afirma simplesmente: “sereis
pescadores de homens”. O que isto quer dizer?
Esta frase deve ser lida não no sentido
quantitativo, típico dos proselitismos e da mentalidade moderna, mas num
sentido mais qualitativo: “pescar homens” é extrair o melhor, fazer emergir a autêntica qualidade humana
desse mar turvo de inumanidade que somos todos.
No
contexto atual, essa expressão tem uma enorme importância: porque é verdade que
nem todos os homens desejam ser cristãos, mas,
seguramente, continua sendo verdade que Deus deseja que cada um extraia de si a
melhor versão possível.
O convite para “pescar
homens” evoca a imagem de sair de um meio aquático e começar a
respirar. Não poderíamos ver aí a possibilidade
de ajudar outros em um novo nascimento, de uma saída das águas amnióticas para
começar a respirar a vida do Espírito?
O chamado de Jesus individualiza e
personaliza. Responder ao chamado de
Jesus inaugura uma nova relação com os(as) seus(suas) seguidores(as): Ele
adiante, nós atrás. Deixamos nossos estreitos mares da vida para navegar
pela imensidão de outro oceano.
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