Síndrome do bom Samaritano cansado e desiludido (Pe. A. Pallaoro sj)

Os sonhos verdadeiros nunca terminam...
Um conjunto de sintomas (desânimo, cansaço, frustração, ativismo, irritabilidade, estresse...) se fazem presentes, cada vez mais, entre os que se dedicam a cuidar dos outros e, entre eles, estão os profissionais da saúde, educadores, sacerdotes, consagrados, voluntários, militantes e líderes de comunidades cristãs, sintomas causados pela sobrecarga de atividades repetitivas e desprovidas de inspiração, num ritmo burocrático e sem o exercício da avaliação das mesmas.

A grande maioria desses “cuidadores” procura viver sua vida com sentido de humanidade profunda, mas experimentam sérias dificuldades pela pressão advinda da quantidade de atividades que se vêm obrigados a fazer e da diversidade de frentes nas quais investem suas energias e talentos...  Como a harmonização de tudo isso parece impossível, eles se vêem afetados pela desilusão, culpabilidade e desconfiança da possibilidade real de viver a fé cristã. De vez em quando, procuram fazer “experiências” pontuais que os reanimam (“carregar as baterias”), mas no final a realidade é muito teimosa e acaba impondo sua lógica e ritmo desumano.

Também somos contaminados pela cultura do imediatismo e do ativismo, vítimas da competitividade que nos é imposta e que nos exige desumanamente. Desse modo, a vontade de ajudar e de servir ficam soterrados pelo esgotamento do dia-a-dia.

Há uma doença terrível e mortal que nos afeta a todos: a “compulsão do fazer; somos definidos pela “produção” e a identidade é engolida pela “função”. E isto se tornou tão enraizado que, quando alguém nos pergunta “quem somos”, respondemos imediatamente pelo “que fazemos”.

Estamos mergulhados na cultura de resultados e a existência se faz maquinal e rotineira; já não encontramos tempo para desfrutar das atividades mais simples e humanas. Somos invadidos por ruídos, atropelos, resultados imediatos e vivências superficiais. Vivemos experiências rápidas, amontoadas, sem possibilidade de avaliação e assim perdemos a história pessoal e comunitária. Com isso, o “modo de viver” torna-se rotineiro e carregado de desencanto; tornamo-nos medíocres e nos acomodamos na passividade.

Nossas ações e trabalho se esvaziam e se tornam “insensatos” (sem sentido, sem inspiração e sem motivação: “para quê?” “para quem?...”); fazemos coisas que não faríamos se pudéssemos tomar distância e discernir. Tudo isso nos faz viver à margem de nós mesmos, na superficialidade sem captar o “mistério” escondido em nós, nos outros e nas criaturas.

Tal situação provoca o enfraquecimento da mística e do entusiasmo que anima permanentemente o cristão, fogo interior que permite manter a paz e a serenidade nos conflitos e nos fracassos.

É nessa realidade diária familiar e profissional que somos chamados a viver em comunhão com Deus e entrar na dinâmica do Espírito Criador, que nos leva a transformar as situações de morte em vida, como fez Jesus.

O cristão é chamado a viver esta mística do amor, da forma como Jesus viveu. Todos os “cuidadores” precisam chegar à conclusão de que não podem ser o centro, mas os provocadores de mudanças sem se afogar pelas preocupações e ansiedades.

É preciso ritmar a vida com períodos de calma, silêncio, oração e avaliação. Do contrário, vão se desgastar e desistir. É neste contexto dramático e perigoso que devemos situar a dimensão e o lugar da espiritualidade, fonte primordial de inspiração e de sentido evangélico de nossa ação.

espiritualidade é a contra-corrente do ativismo. Se, de um lado, o ativismo nos arrasta para a repetição e a conservação, de outro lado, a espiritualidade nos impulsiona para a busca, a criatividade, a ação discernida visando o “maior e melhor serviço”.

A espiritualidade abraça tudo, dá sentido a cada ação e a cada gesto, pois nada do que é humano lhe é estranho. A realidade cotidiana é o “lugar” onde somos chamados a viver a espiritualidade cristã e a deixar-nos conduzir pelo mesmo Espírito que animou Jesus e o levou assumir o risco do compromisso.

A espiritualidade reacende desejos e sonhos, desperta energias em direção ao “mais”; faz descobrir a presença amorosa do Deus Pai-Mãe. A Espiritualidade nos faz ser criativos e ousados em tudo o que fazemos e dá sentido e inspiração a cada ação humana, por mais simples que seja.

dimensão espiritual se revela no diálogo consigo mesmo e com o próprio coração e se traduz pelo amor, compaixão e escuta do outro. Espiritualidade significa viver segundo a dinâmica profunda da vida, pois defende sempre esta, contra os mecanismos de morte. 

Uma pergunta: Você conhece algum `bom samaritano´ desencantado e desiludido?

6 comentários:

  1. Eu sou professora e apesar de gostar muito do que faço me sinto cansada e esgotada. Minha vida espiritual é quase inexistente porque encho minha rotina de compromissos. O que devo fazer?

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  2. Bom dia! Mandou bem o texto de hoje... Tem muito a ver comigo: cansada e desiludida! Grata!

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  3. "Padre; nos identifica con su reflexión: necesitamos la fuerza del espíritu interior, para superar tanta adversidad y menoscabado apoyo de parte de los superiores-jefes-patrones..., un mínimo reconocimiento en algunos sectores (los más). ¿Qué hace que se viva de esta forma, por qué?
    La humanidad, o mejor la sociedad actual vive tan acelerada; le interesa sólo lucrar, sacar beneficio monetario de lo que sea; no le interesa el ser humano, la persona, el dolor, el sufrimiento.
    Esta sociedad actual vive para satisfacer necesidades pasajeras, superficiales, personales y egoístas de unos pocos. Sólo de aquellos que mandan, dominan, gobiernan, tienen poder.
    Nos hemos olvidado del otro/a. No existe el/la buen/a samaritano/na.
    Porque nos falta el verdadero Dios-Amor en nuestro interior, en nuestro corazón. Y, lamentablemente los que debieran guiarnos hacia ello, no lo hacen; dan un pésimo ejemplo de egoísmo y vanidad. Incluida, lamentablemente la Iglesia católica; aunque hay excepciones, como los Santos/as y por supuesto el Papa Francisco actual.
    Dios permita muchos lo imitemos en su ejemplo no sólo de palabra, sino en sus gestos y su vida ejemplar. Muy agradecida. Bendiciones abundantes".

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  4. Todos precisamos de palavras como essas ... gratíssimo Pe. Ramon !

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