15º DTC: SOLIDARIEDADE como êxodo do amor... (cf. Pe. A. Palaoro SJ)

Na tua opinião, qual dos três foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?... (Lc 10,36)

Em todo ser humano há reservas de bondade compaixão, adormecidas muitas vezes, mas que podem aflorar diante do sofrimento dos outros. Nas pessoas sofredoras, nos crucificados da história há algo que atrai e nos faz sair de nós mesmos; eis a origem da solidariedade, o sentimento de proximidade com as vítimas deste mundo.

A parábola do Bom Samaritano com os gestos oferecidos ou negados ao homem ferido. Gestos que vao além de todos os credos e culturas, transformando o estranho em próximo.

Diante da pergunta do especialista em leis: quem é o meu próximo? Jesus responde invertendo e reformulando a pergunta: quem se torna próximo?”.

Quem é o meu próximo? Uma pessoa “qualquer”, sem nome, que passa ao seu lado, cai em desgraça e clama por auxílio. A “proximidade” se define pela “travessia” em direção ao sofrimento e à exclusão.

O infeliz da parábola lucana é o paradigma do ser humano que precisa de ajuda. Ele representa a alteridade carente, “ferida” que, em sua carência questiona o meu eu, impelindo-me para o êxodo do amor.

A parábola do samaritano revela um sentido ainda mais profundo: do silêncio do corpo daquele infeliz - de quem não se sabe o nome, não se vê o rosto e nem sequer se diz que pediu ajuda, mas questiona o caminho dos passantes e os convoca à responsabilidade urgente. Ajudar ou não eis a questão.

O sacerdote judeu e o levita viram bem e entenderam o que tinha acontecido, através de um olhar de banda, carregado de suspeita, receio e desconfiança. Seguramente se perguntaram: “Que pode acontecer comigo se me aproximo dele e o ajudo?...” Seu comportamento seria outro se se perguntassem: Quê pode acontecer a este homem, se me aproximo dele e o ajudo?

O pecado deles é a omissão: não fazem nada, nem de mau nem de bom. São piedosos, mas insensíveis; a religiosidade não se traduz em gesto fraterno. Enganam-se pensando que se chega a Deus pelo caminho vertical, e não pelo horizontal da ajuda fraterna. Amam a Deus só de palavras e de boca, e não com obras e de verdade. Não percebem que só no amor ao próximo é que se revela o amor a Deus.

“Viram”, masnão se deixaram afetar pela pessoa necessitada. O amor a Deus não se expressou como amor ao próximo. Julgavam-se estar unidos a Deus, mas na verdade estavam distantes do irmão sofredor. A fé sem obras é morta. 

Além disso, o “legalismo” falou mais forte que a lei da vida no coração dos dois responsáveis pela religião. Invocando a lei da pureza ritual (proibia o contato com cadáveres!), sentiram-se dispensados de acudir o necessitado. A obediência ritual superou o apelo moral.

Mais contrastante foi a atitude do samaritano: chegou perto, viu e sentiu compaixão”. É a dinâmica da misericórdia! Tudo começa com o “aproximar-se”. É impossível ser afetado sem proximidade. Enquanto o sacerdote e o levita se desviaram do homem caído no chão, o samaritano “achegou-se”. A proximidade física permitiu-o “vê-lo”de fato.

O “ver” do samaritano vem depois de chegar junto ao ferido. O aproximar-se é o primeiro passo. O samaritano optou pelo amor.

A experiência cristã se constitui como uma “mística de olhos abertos”, que como um colírio dilata as pupilas dos olhos para captar o horror tremendo do inferno da pobreza e da exclusão.

Olhar-nos com os olhos do outro que nos visita supõe uma autêntica revolução interior. O olhar do outro nos arranca do “ensimesmamento” que nos cega e desmascara a enfermidade raiz de nossa cultura atual:  a indiferença e a cínica apatia diante da dor dos pobres e marginalizados.

A parábola do samaritano desvela seu significado último e perturbador: no “outro” Deus nos fala e nos encontra, convocando-nos para a solidariedade. Onde está Deus?” Não está entre os conhecedores de Sua identidade, não está nas instituições que o representam, mas está lá, onde ninguém o espera: quem não é “nada” O hospeda e O aponta.

Jesus deslocou Deus transferindo seu habitat do templo para o corpo que está à “beira da estrada”. O excluído é doravante, a revelação da Sua presença.

“próximo” chama, clama para cada um sair de si mesmo e caminhar em direção ao outro. Importa “reinventar” com urgência a solidariedade como valor ético e como atitude permanente de vida que se encarna nos pequenos gestos de inclusão.

Sugiro que nesta semana você se aproxime de alguma pessoa necessitada.


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