Santa Maria do Céu e da Terra...

 


 

Conforme prometera a nossos pais, em favor de Abraão e de sua descendência para sempre...

 

Neste domingo celebramos a festa da Assunção de Maria. Normalmente, quando pensamos na Assunção, vêm à nossa mente muitas imagens de Maria olhando para o alto, com as mãos juntas, rodeada de anjos, sobre nuvens que indicam que é elevada ao céu. É uma festa que nos fala da santidade e da plenitude d’aquela que mais amou, conheceu e seguiu seu Filho. 

 

O próprio Evangelho deste domingo nos ajuda a tomar distância das imagens tradicionais da Assunção e nos apresenta Maria com os pés na terraEla foi “assumida” por Deus porque “desceu” ao mais profundo da história humana, fazendo-se solidária e servidora em favor de seus filhos e filhas. É na vivência de “saídas” e “encontros” que Maria se revela próxima de todos nós; continuamente, somos chamados a viver a “cultura do encontro” e do deslocamento solidário, sobretudo com os mais pobres e excluídos.

 

O evangelho da Visitação, nos revela o encontro de duas mulheres grávidas. Maria e Isabel são o ícone do verdadeiro “encontro”, carregado de hospitalidade, alegria e serviço; ambas, em idades diferentes, se acolhem, se entendem e se ajudam mutuamente, pois compartilham o mistério da vida que cada uma carrega em seu ventre. É como se uma dissesse à outra: “isto que está acontecendo em seu ventre é coisa de Deus...

 

Segundo Lucas, Maria, depois de receber a notícia de que será a mãe do Messias, “pôs-se a caminho” com “prontidão”... Trata-se de uma decisão que brotou de sua nova condição de futura mãe. Deus saiu ao encontro de Maria e esta vai ao encontro de Isabel.

 

São duas gestações que nos convidam a contemplá-las à luz da fé, porque acontecem em circunstâncias que humanamente são impossíveis. No caso de Maria, porque “não conhece homem algum e, no de Isabel, porque é anciã, “concebeu na velhice”vida que nasce de Deus rompe todas as normas, supera nossos cálculos, nos surpreende, irrompendo com força ali onde nós não vemos possibilidades.

 

Esta experiência de que para Deus “nada é impossível”, de que Ele sai ao encontro e faz surgir vida em duas mulheres simples, como entre tantos pobres e humildes, é uma realidade vivida pelas primeiras comunidades cristãs, pobres, pequenas e perseguidas. São muitos que, às vezes, se sentem como Isabel: idosas e cansadas para algo novo, ou muito sós e cheios de dificuldades para acolher as surpresas de Deus.

 

Duas mulheres grávidas, que se encontram; de que falam? Sem dúvida, da “novidade” de seus ventres, de sua alegria, do futuro... O evangelho diz, que a alegria é transbordante e contagiosa, tão profunda e intensa que “o menino salta no ventre de Isabel” e esta se enche do Espírito de Deus. 

E a partir deste Espírito, falam de um futuro que as transcende, que não é só o futuro de seus filhos, é o futuro de todo o povo, de toda a humanidade.

A profundidade da alegria e da fé faz com que este encontro adquira outra dimensão: do encontro de duas mulheres passa a ser o encontro definitivo e permanente de Deus e nosso mundo, seu mundo.

 

Assim, Maria se põe a cantar ao Deus da vida e ao mundo novo que Ele torna possível; ela, consciente do que está vivendo, deixa jorrar de seu interior um ousado cântico que expressa uma das imagens de Deus mais inspiradoras e carregadas de esperança do Novo Testamento.

 

Maria expande sua consciência maravilhada da ação de Deus nela e para além dela; em Deus, ela se sente em sintonia com a história de seu povo e da humanidade inteira. Descobre que Deus é grande porque entra na história a partir dos últimos, dos pobres e deslocados. E afirma com contundência que é a ela, humilde mulher nazarena, a quem todas as gerações chamarão bem-aventurada.

 

E esta experiência de que Deus “faz maravilhas nela”, Ele é misericordioso e que esta misericórdia, realizada nela, se estende, de geração em geração, sobre aqueles que o temem, sobre aqueles que creem n’Ele e O amam.

 

Aclamar e celebrar hoje Maria, que é levada ao encontro definitivo com Deus, nos compromete a viver, como ela.

 

No Magnificat, Maria canta a sua própria história e “faz memória” da história de seu povo. Ninguém vive uma vida espiritual fecunda enquanto não for capaz de assumir aqui-lo que “é” na sua originalidade, se não for capaz de construir a relação com Deus como um diálogo vivo entre um “eu” e um “Tu”. 

 

À luz do Magnificat, a história não se reduz a eventos opacos, vazios, tristes...

 

O Magnificat nos faz ver o que todo mundo vê, mas de um “modo” diferente: vemos mais longe, vemos além, vemos mais fundo...

 

O encontro com a História Sagrada nos ajuda a ler nossa história sob nova perspectiva: a da salvação. Deus desce à nossa própria história, iluminando-a e carregando-a de sentido.

 

memória nunca é experiência vazia, mas algo pleno, uma faculdade que afunda suas raízes no coração da existência. Quando evangelizada, ela nos ajuda a reler o passado sob nova luz. E só podemos “ordenar” a história quando ela é revivida diante dos olhos misericordiosos de Deus. Então, tomamos consciência que o mesmo Deus encontra mais facilidade de “entrar” em nossas vidas através dos fracassos, feridas, fragilidades... Deus “entra” no mundo pelo “avesso” da história.

 

Marcados pela “mística mariana”, cremos profundamente na força evocativa e transformadora da história. Encontrar-nos com a história significa caminharmos para o interior do mistério da mesma história; significa também deixar-nos questionar, iluminar e mobilizar por ela.

 

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