Vestes litúrgicas ou pura vaidade?


Ao longo da Semana Santa, circularam pela internet reflexões críticas sobre os diversos paramentos utilizados alguns presbíteros e seminaristas nas liturgias.

Diante de inúmeras imagens de padres ornamentados, divulgadas nas redes sociais, a doutora em Teologia pela FAJE/BH, Solange Carmo, não se conteve e publicou a seguinte postagem:

Meu Deus, não sei se fico mais assustada com as notícias da lava-jato e da administração Temer ou com o tanto de postagens mostrando os panos e adereços religiosos que meus alunos e ex-alunos de teologia redescobriram nos armários das paróquias. Batina, capa, túnica, sobrepeliz e até barrete! O brega voltou à moda; tornou-se fashion! Não me envergonhem, alunos meus! A teologia que vocês aprenderam nos dois institutos onde leciono não ensinou vocês a revirarem os armários em busca de modelitos religiosos, mas a revirarem as entranhas do coração em busca da misericórdia… Meu Deus, onde foi que erramos?

O clericalismo tem várias características, e uma delas são os excessos das vestes litúrgicas, bem como hábitos e roupas clericais. Os que assim procedem, de modo geral, escondem certas patologias que precisam ser tratadas. Se os bispos fossem mais ousados expulsariam muitos destes do seminário. Mas o que ocorre é que muitos bispos sofrem do mesmo mal. Todos, sem exceção, se encontram na contramão do evangelho. Jesus abominou essa hipocrisia, disse alguém. E outro defende o contrário:

Que surjam cada dia mais padres dispostos a manter viva a tradição litúrgica de celebrar dignamente os santos mistérios usando os paramentos os quais a igreja permite e orienta que sejam usados em seus atos litúrgicos. Não é revirar armários. Mas o gosto por preservar a tradição e a beleza da liturgia bem celebrada. Não é necessário despir-se do belo e do tradicional para estar com o povo. A beleza sacra e o serviço do povo podem caminhar juntos. Obrigado Santo Padre Bento XVI (pai do reavivamento tradicional?), e que tenhamos coragem de entender que o marxismo não pode caminhar na Igreja. Parabéns as estes ex-alunos que não se deixaram contaminar com o secularismo desenfreado. 

Na liberdade da reflexão crítica e autocrítica, a professora Solange Carmo, diante das reações contrárias, ofereceu uma resposta ainda mais provocante:

Eu não acuso vocês de nada, mas não posso me calar diante do que tenho visto. Não duvido da reta intenção de vocês, mas devo esclarecer alguns equívocos: 

1) O uso dessas vestes não é sinal de amor à liturgia e muito menos ao Evangelho. É sinal de ostentação e de poder sacro. O despojamento, a renúncia aos privilégios e a simplicidade são sempre indicados como sinal do seguimento de Jesus. O sinal do Evangelho é o amor.
2) Veste talar são antigas peças de museu que fizeram parte da história da Igreja quando ela esteve atrelada ao poder. O presbítero – um nobre da corte – se vestia como era costume dessa classe social naquela ocasião. Hoje isso é simplesmente descabido. 
3) Em tempos de Francisco, ressuscitar tais vestes é um despropósito e fazê-lo na Semana Santa é um acinte ao mistério celebrado. Olhemos para o Cristo nu na cruz. Aquele paninho que tampa suas partes genitais foi posto pela caridade cristã. Ele morreu nu, desvestido de tudo... E não há liturgia maior que a liturgia da cruz. Certamente o presbítero não vai celebrar pelado, mas vai aprender com o desapego do Nazareno a se vestir com discrição e simplicidade. 
4) Seria bom perguntar: Tradição de que tempo? Das origens cristãs não é, com certeza. Vocês gostam tanto de apelar para a Tradição. Pois bem, apelemos! Voltemos às comunidades cristãs originais. Já pensou o presbítero ou ancião celebrando com tais vestes naquelas catacumbas fedidas? Ah, voltemos a Pedro, a pedra da Igreja. Já pensou o pescador do lago de Nazaré com essas roupas? Sejamos razoáveis por amor à Tradição cristã. 
5) Por fim, tais vestes, infelizmente, não servem ao altar mas àqueles que as portam. Elas projetam o presbítero, colocam-no num pedestal imaginário; criam uma eclesiologia totalmente deformada da fé cristã mais genuína e – pior – servem para esconder muitas perversões. Vejam os exemplos dos fundadores de comunidades e congregações neoconservadoras que têm estado sob investigação de Roma. Será que queremos seguir esse caminho? Um amigo meu me disse que, estando num bar LGBT para comemorar aniversário de uma amiga, viu por lá muitos seminaristas. Nada demais se se comportassem como deve um cristão, mas não: mostraram conduta moralmente reprovável. Na semana seguinte, estavam fazendo longas procissões ostentando belas vestes, batinas, sobrepeliz e capas...

O Evangelho se esvazia de sentido tanto mais nos enchemos de apetrechos e tentamos ressuscitar esses costumes já ultrapassados. Por favor, menos vestes, menos glamour; e mais amor e acolhida do Evangelho e dos pequeninos do Reino.



Totalmente de acordo. E você o que pensa?

4 comentários:

  1. O autor do blog e a autora do artigo, deviam seguir o exemplo do Papa Francisco: "Quem sou eu para julgar". Já que vocês se julgam no direito de julgar os outros, eu também os julgarei. A sua atitude é de puro orgulho disfarçado de pobrismo. Vivemis tempos em que o belo e rejeitado e se cultua o mau gosto. Basta ver como a maioria dos padres, das freiras e dos leigos "enganjados" se vestem. Se querem ser simples, pelo menos não sejam cafonas.

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  2. Isso é um equívoco moderno. A batina tem o seu significado próprio. Já estudei na FAJE e vi com que vaidade os jesuítas exibiam seus colares indígenas e anéis de tucum. São símbolos de orgulho e também de mau gosto como o colega acima se referiu. Lembro-me de como religiosos abraçavam entusiasticamente mulheres achando que psicologicamente estavam exorcizando recalques freudianos. Isso é de uma estupidez tremenda. O sacerdote não pode se esconder, mas ele tem que ter prudência ao se relacionar com os outros. Depois do Concílio Vaticano II a igreja ainda não superou sua crise de fé. O autor poderia dizer quantos jesuítas existiam em 1962 e quantos existem em 2017? A sra. Solange é mesmo "pobre" de espírito, mas realmente não dá para julgá-la, pois onde ela leciona seria praticamente impossível pensar de outra forma.

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  3. A professora Solange em seu comentário em nenhum momento fez referencia as vestes de Irmãs religiosas, mais sim das vestes litúrgicas de certos sacerdotes que em certas celebrações esquecem que Jesus deve ser o centro e não suas vestes. O mestre da Galileia se fez pobre com vestes simples e arrastou multidões não porque usava roupas belas, mas porque falava da novidade do Reino e das suas beatitudes de maneira simples sem aparecer mas deixando transparecer o Rosto misericordioso do Abbá Papaizinho querido.

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  4. Vivemos em tempos onde se falta a sobriedade. Principalmente o diálogo. É costumero nestas "conversas" as trocas de acusações de ambas as partes, o que nao leva a lugar nenhum. Temos que ser maduros, o uso de definições como, "armario paroquial", não cabe mais. Isso gera revolta e vemos assim um ciclo de ataques começar.Estas atitudes ocorrem principalmente em sala de aula e por autoridade, os alunos fingem que aprendem e os professores fingem que os alunos aprenderam. Professores e alunos que querem enfiar suas verdades guela abaixo um do outro. Triste. Falta maturidade de ambas as partes.

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